quarta-feira, 6 de agosto de 2025

A quem já pisou este chão

 




Ainda andas por aí?


Hoje

passaram passos leves

mas nenhum sabia o teu nome.

 

Deixaste um traço numa pedra

no outro dia.


Pensei que eras tu.

Era só sombra.

Mas esperei

mesmo assim.

 

Continuo a escrever.


Continuo a amar-te

como se a árvore fosse a nossa casa comum.


Se me tocares no ombro

reconhecerei o peso exato da tua saudade.




BL

06.08.25





terça-feira, 5 de agosto de 2025

Rio de ecos

 

 



Desenho em traços sem nexo

um jardim de afetos

que em prosas e versos

e em esquinas perdidas

me incendeia as veias.

 

Em mim flui ainda

um rio

que em morosos movimentos

se solta de cais e amarras

e se dispersa por folhas brancas

onde acendo velas

e suspendo boias

visíveis nas vidraças das janelas.

 

Enegrece o azul

num tempo de imagens e de enigmas

que se refletem em espelhos

presos na moldura de nuvens

onde o horizonte sombreia.

 

E eu

sentada em degraus de pedra

desdobro a vida que passa num leito de ecos

pela noite branca.




BL

20.07.2010





Ser aparência

 


Fica-me a aparência de ser,

imagem

do que não sinto,

do que não sei.

 

Experiência de uma vida

entre ausências

repartida,

esquecida.

 

Despeço-me

de mim,

sem que me tenha encontrado,

culpada

do que não fiz,

do que não procurei.

 

Pedaços

de sonho,

de ilusão.

 

O que me fará correr?

Por que hei de sorrir?

 

B.L.

09.02.90








terça-feira, 24 de junho de 2025

O que a poesia também pode ser

 





Poesia é estar contigo,

é dar-te o beijo que não me pediste,

dizer-te as saudades que sinto,

a meio do dia.


É a flor 

que está para além das palavras,

o silêncio cúmplice

de um pôr do sol.


É cantar com os melros

e dançar com as cores

que pintam o meu jardim.


É o ritmo melódico

dos afetos,

a cadência harmoniosa da solidariedade.







BL
21.03.2006







sábado, 26 de abril de 2025

Colheitas de amor

 







“Mãe, fala-me de mim.

Gosto tanto que me fales de mim!...”

E foram lampejos

de risos

e de lágrimas.

Searas de ternura

em campos de areia e de neve.

Colheitas de amor

e saudade.

Doçura de rostos,

passinhos trémulos,

gestos sem norma.

“Porquê, Mãe?

Explica-me...”

Procuro a palavra,

a definição.

É preciso clarificar

a situação.

“Cuidado, mãe!

Não me deixes cair!

Nunca, mãe…”


B.L.

15.11.1989





domingo, 22 de agosto de 2021

A dor de um sonho ousado

 


Fere-me a certeza do imutável,

o fluir do quotidiano

sem certezas.

O medo de perder

o que ainda não obtive.


Dilui-se a força 

do querer,

o desejo

de acreditar.


Fica a dor

do sonho ousado,

do poente

em horizonte

avermelhado.


B. L.


quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Entre tempos







Em mim se entrelaçam todas as melodias do mundo
na trajetória de uma brisa que ilude as solidões
no véu de luz que transporta.

Cerro os meus olhos para entender
os silêncios
matizando as cores
repartindo as verdades entre as minhas folhas
entre os meus frutos
acompanhando o azul e o sol que lhes moldam as estradas.

Gravo nas palavras a fragilidade dos instantes
os vidros quebrados tocados pelo vento
sem saber como se sai
desta inaptidão da alma
onde a chuva me açoita
e grita
e sucumbe
quando articula o meu nome.

Sento-me na orla do tempo
como quem sopra memórias em dentes-de-leão
e invoca dias claros
para desfolhar a recontagem dos silêncios.